quinta-feira, 13 de outubro de 2011

A Paz e o Cotidiano Escolar

O tema Educação Para a Paz tem como eixo central uma proposta pedagógica de educação para a Paz nas escolas, embasado na epistemologia crítica de Paulo Freire onde através do diálogo se busca o saber fazer a Paz na relação entre os cidadãos e possibilitar a convivência pacífica. Educar para a cultura da Paz através do diálogo, da solidariedade, da fraternidade, e da libertação humana.
Paulo Freire enfatiza que é na busca incessante do homem pela justiça que se cria e constrói a Paz, e que esta justiça social pode ser praticada com generosidade, amor, tolerância respeitando as diferenças de classe, de etnias, de credo religioso, sem estilismos, sem autoritarismo, e sem centralização de poder. Uma educação onde os valores têm inicio na família continuidade e aprofundamento na escola seguindo seu curso natural no trabalho, nas manifestações culturais, nos movimentos e organizações sociais etc.
Atualmente a sociedade esta imersa numa complexa inversão de valores e em situações cada vez mais desgastantes na convivência entre os indivíduos, por causa destas diferenças a escola tem sido historicamente uma instituição fundamental de apoio e construção na educação de ensino-aprendizagem dos valores morais e humanos.
“De anônimas gentes, sofridas gentes, exploradas gentes aprendi sobretudo que a Paz é fundamental, indispensável, mas que a Paz implica lutar por ela. A Paz se cria, se constrói na e pela superação de realidades sociais perversas. A Paz se cria, se constrói na construção incessante da justiça social. Por isso, não creio em nenhum esforço chamado de educação para a Paz que, em lugar de desvelar o mundo das injustiças o torna opaco e tenta miopizar as suas vítimas.”( Paulo Freire)



Sendo assim, a missão de ensinar os valores morais no âmbito do desenvolvimento é por excelência das instituições educacionais através da seleção de conteúdos e metodologias que favoreçam temas transversais (Justiça, Solidariedade, Ética etc.). Utilizando para tanto, projetos interdisciplinares de educação em valores, aplicados em contextos determinados, fora e dentro da sala de aula. Na escola parceira estes valores são trabalhados nas aulas de religião e nas dinâmicas de grupo ministradas pelo orientador pedagógico.
            A escolha do tema Educação pela Paz teve como base as idéias de Paulo Freire que defendem os diálogos entre educadores e educando, em uma educação de valorização do ser humano, portanto uma educação libertadora, transformadora capaz de impulsionar educadores e educandos numa busca constante por uma sociedade mais fraterna e solidaria. Também por acreditar que o êxito de uma escola e seus educadores esta diretamente ligada ao modo como estas questões são tratadas, sabemos que educando para a paz estamos construindo uma sociedade de igualdades.
Sendo assim a escola, seus gestores, seus professores e os demais colaboradores através da educação são responsáveis por grande parte da formação do caráter de seus educandos, visto que estes chegam à escola com pouca idade. Ter na educação o caminho para a paz é a consciência observada nas escolas parceiras.
No desenvolvimento de todo o trabalho de pesquisa nos eixos anteriores bem como nas observações realizadas em sala de aula, é percebemos o tratamento de igualdade a todos os alunos.
Em entrevista com a Diretora Sandra foram colocadas as questões relevantes ao tema educação para a Paz na escola parceira.
  1. 1.    Diretora Sandra há na escola projetos direcionados a construção de uma cultura de Paz? Não um projeto específico, e sim uma construção diária dentro de cada sala de aula e com todos os professores, paralelo aos projetos já existentes como 5S do grupo Gerdau e um projeto em desenvolvimento onde a escola esta trabalhando paisagismo. Sabemos das dificuldades e da necessidade de implantar uma educação que irradie os valores humanos e morais desde cedo, por isso não deixamos de buscar um espaço para explicar as coisas verdadeiras. Temos que ser mestres e discípulos ao mesmo tempo, ouvir para nos fazer ouvir, só assim avançaremos. Há um engajamento de todos na construção dos valores, e um maior aprofundamento com trabalhos de dinâmicas em grupo ou individuais aplicadas pelo Coordenador Pedagógico. Além deste os professores do ensino religioso trabalham valores humanos e generosidade.


  1. 2.    E quando ocorrem as desavenças entre os alunos como são resolvidas as questões? Se fugir do controle do professor em sala de aula, são transferidas para mim ou para o Coordenador. Fazemos uma investigação e por meio de conversa resolvemos, caso haja necessidade de comunicar a família é tomada providência e aprofundada a investigação. Quando a criança vem com problemas e isso se refletir no comportamento ou no aprendizado chamamos os pais ou responsáveis para conversar e encontrar juntos uma solução, até mesmo assistência psicológica para a criança ou a família.


  1. 3.    Com resultados positivos? Alguns, aqui na escola há realmente poucos casos, a nossa comunidade local é uma comunidade de trabalhadores, com poucas exceções. Normalmente as mudanças comportamentais são detectadas nas separações de casais, as crianças precisam se adaptar a uma situação nova, quando ficam com a mãe sentem a falta do pai, muitas vezes acabam indo para casa dos avós, e então a falta de ambos os pais. Acontecem também situações aleatórias como no caso de uma menina moradora na área rural. A mãe por displicência ou por morarem no campo não cuidava da higiene da criança, e claro que os colegas de sala perceberam e colocaram apelidos, diziam que estava mal cheirosa, enfim se manifestaram.


  1. 4.    Que providencias foram tomadas, isto não poderia caracterizar Bullying? Não chegou a ser Bullying porque foram tomadas providências cedo. Chamamos as crianças, digo crianças, mas são pré-adolescentes têm entre 12 e 13 anos, conversamos mostramos para elas a importância do respeito, e as possíveis razões das diferenças. A mãe também foi orientada a cuidar melhor da criança, desde então tudo ficou tranqüilo. Outro caso recente trazido por um professor foi quando um menino passou a mão no seio de uma menina. Neste caso impus a minha condição de Diretora, fui arbitrária, passei uma punição que o fez refletir para que não tenha mais esse tipo de atitude. Em situações como esta, não é preciso chamar a atenção nem tornar público o episódio, basta tomar medidas educacionais condizentes com o acontecimento, e que sirvam como correção da atitude.


Deixa-nos uma frase para reflexão, uma que você gostaria de ver estampada em todos os lugares alertando a todos os olhares para a consciência de um mundo melhor. Podemos refletir sobre um mundo mais humano e solidário, começando com a nossa prática diária de educação para a Paz, colocando nossas teorias e sonhos, em ações harmonizadoras com a vida e seu curso natural.
Depois de encerrar a entrevista com a Diretora da escola parceira, fez-se necessária uma reflexão para a melhor compreensão do tema educação para a paz dentro da escola parceira. Os diversos elementos trabalhados na escola alimentam a teoria de que é dentro da família que a criança começa a ser educada tanto para a paz quanto para a violência. A família é a grande responsável pela educação das crianças. Esta educação deve ter como base o amor e o respeito pelos seres humanos em sua totalidade.
Portanto discutir a paz é provocar os mais nobres sentimentos, a escola é uma Instituição e funciona como um conjunto, cada sujeito desempenha seu trabalho. Sob esta orientação, equipe diretiva, professores e funcionários da escola parceira trabalham visando uma educação emancipatória e de respeito aos sujeitos. Esta é uma constatação perceptível desde o inicio da parceria, sustentada pelas conversas com a professora parceira, também pelas entrevistas na escola ao longo do trabalho de pesquisa realizado na mesma.
Desta forma a educação para a paz esta inserida na escola e faz parte do currículo escolar o ensinamento dos valores como: Solidariedade, cooperação, fraternidade e respeito ao próximo.
Este é um tema amplo e compete à família e a escola desenvolver o exercício educativo da cultura da Paz. Isto porque a Paz é um comportamento e precisa estar presente em todos os nossos atos e ter espaço no nosso cotidiano.
Na EMEF Santa Rita, segundo o Diretor Luciano Leites, o desenvolvimento de uma cultura de PAZ se faz através de vários projetos de aproximação entre comunidade e escola e de resgate de valores morais em seus alunos, que alguns, por dificuldades familiares acabam por distorcer ou não compreender alguns valores. Resgatar valores morais como respeito, tolerância, generosidade e solidariedade é o início para a construção de uma cultura de paz.
Durante todo o ano a escola promove eventos para realizar a aproximação, realiza festas, palestras, comemoram datas festivas, jogos, atividades culturais e religiosas, nas reuniões escolares são realizados sorteios de cestas básicas e outros presentes, por ser uma comunidade muito carente se utilizam desses artifícios para convidar os pais a participar, além disso, tem o Projeto Escola para Pais, onde acontecem palestras com psicólogos, profissionais da saúde, que falam sobre doenças, drogas, e ainda o Conselho Tutelar que dão orientações aos pais no relacionamento com os filhos, ainda fornecem lanches e brindes, tudo para atrair a família que se torna mais participativa, tanto nas decisões da escola, quanto na vida escolar de seus filhos.
A orientadora pedagógica Kátia nos relata que em sala de aula os professores conversam sobre valores morais, e são realizados conselhos com os alunos, desenvolvidos pela orientadora, ao final de cada bimestre, temas sobre paz, respeito mútuo, convivência. Existe ainda a carteira do aluno, onde os alunos se auto avaliam e os critérios são mudados conforme a necessidade. Alguns critérios são: sigo as regras; uso as palavras mágicas; assiduidade; pontualidade; respeito com colegas e professores; faço as tarefas. Outra dificuldade que esta sendo trabalhada é a violência ocorrida no horário do recreio, alunos maiores agredindo alunos menores, então se iniciou o recreio dirigido, onde cada turma tem atividades orientadas e acompanhadas pelo professor, com jogos, sapata, fla-flu, ping-pong, jogo da velha, as regras são estipuladas pelos próprios alunos. Estão vendo resultados quando os alunos ficam sozinhos, já não ocorrem tantos casos de violência.
Acontece ainda o Projeto Escola Aberta, onde participam em torno de 35 pessoas, é realizado aos sábados e domingos, atinge toda comunidade escolar, com atividade de recreação, esporte, manicure, maquiagem e penteados, técnica em pintura, culinária, artesanato, expressão corporal e teatro, são atividades variadas e de interesse tanto dos alunos quanto dos pais, que também servem de renda extra para estas famílias. Com este projeto as crianças deixam de estar na rua e estão dentro da escola aprendendo coisas que levaram para o resto de suas vidas, e ainda estão acompanhadas de suas mães e familiares, unidos nas atividades.
O Coordenador do projeto é o Prof. Ewerton Vieira com o apoio da professora Patrícia, nos dizem que o objetivo deste projeto é: “Contribuir para a melhoria da qualidade da educação, a inclusão social e a construção de uma cultura de paz, por meio da ampliação das relações entre escola e comunidade e do aumento das oportunidades de acesso a informação para a cidadania, de maneira a reduzir a violência na comunidade escolar.”
A EMEF Santa Rita de Cássia encontra-se em uma área de risco social, com famílias muito carentes e algumas desestruturadas, precisando de ações que contribuam para o desenvolvimento moral dos alunos, percebe-se um comprometimento dos profissionais em educação para atender estas dificuldades. Esta postura de professores e funcionários da escola nos mostra que podemos e devemos fazer escolhas, pois elas são o propulsor de uma sociedade de violência ou de paz, escolhemos nossas atitudes com o outro e com o mundo diariamente, se optarmos por atitudes dignas, de respeito, de generosidade, de justiça e de solidariedade, estaremos construindo uma cultura de paz.
Na EMEF Miguel Couto, a situação não é considerada de risco, por isto, não há uma preocupação demasiada com relação ao desenvolvimento de valores morais, porque a maioria das famílias, com raras exceções, possui uma estabilidade afetiva, mesmo que nem sempre exista a presença do pai ou da mãe, existe um responsável que transmita estes valores. A proposta por uma cultura de paz e da transmissão de valores é introduzido através das conversas realizadas com os alunos diariamente em sala de aula, ou individualmente dependendo dos casos ocorridos eventualmente na escola.
Depois desta reflexão podemos dizer que experiências aqui relatadas possibilitam fazer as seguintes comparações, entre os trabalhos e projetos desenvolvidos nas escolas EMEF Miguel Couto e EMEF Santa Rita de Cássia. Independentemente do contexto social e dos trabalhos realizados nas escolas, a troca de experiências proporcionou o crescimento e o aprofundamento do tema educação para a Paz.
Nossas entrevistas são concordantes, onde encontramos semelhanças entre as dinâmicas aplicadas para desenvolver os conceitos relativos aos valores em sala de aula e através da realização de festas comunitárias e eventos que promovam a aproximação da comunidade com a escola. Proporcionando assim, uma prática coletiva e produtiva que valoriza os indivíduos como sujeitos participantes de uma sociedade em que há necessidade de diminuir as diferenças e que tenha maior respeito ao próximo, formando cidadãos integrados a uma cultura de paz.
Os aspectos que diferenciam as escolas são: na EMEF Miguel Couto não é desenvolvido nenhum projeto específico voltado para a Educação Para a Paz, todos os trabalhos realizados são paralelos aos projetos já existentes como o 5S da Gerdau que é a educação voltada para preservação do meio ambiente e um projeto de paisagismo que será implantado para a formação de desenhos artísticos através do grafite. Enquanto na EMEF Santa Rita de Cássia os projetos são realizados durante todo o ano em conjunto com a comunidade, promovendo a participação direta onde todos os sujeitos se voltem para a construção de uma cultura de paz.
Percebemos na comparação dos resultados obtidos com as pesquisas, haver necessidade da extensão e do prosseguimento do estudo por se tratar de um tema fundamental no desenvolvimento cognitivo das crianças e para o resgate de valores morais sucumbidos em um mundo voltado para o materialismo. “Em que o ter vale mais do que o ser”. Não sendo esta a proposta das escolas, dos pais e da sociedade.
“O comportamento de cada individuo é aceito pelos seus próximos quando subordinados a parâmetros, que denominamos valores , e que determinam os acertos e equívocos na produção e utilização das intermediações criadas pelo homem para sua sobrevivência e transcendência.” (Educação para a paz - Ubiratan D’Ambrosio - 2000)
A prática de valores morais na escola é o caminho para o desenvolvimento de regras de bem proceder em grupo, a criança sai do convívio da família para integrar uma sociedade maior, com diferenças marcantes, e precisa aprender ou reforçar o aprendizado adquirido no seu lar, sabendo distinguir o bem do mal, e buscando sempre o bem de todos, respeitando as hierarquias e os grupos que começa a participar nesta nova fase de sua vida e permanecerá durante muito tempo, aprendendo que vivenciará este tipo de comportamento por toda sua vida.
“uma das condições fundamentais é tornar possível o que parece não ser possível. A gente tem que lutar para tornar possível o que ainda não é possível. Isto faz parte da tarefa histórica de redesenhar e reconstruir o mundo” (Paulo Freire)
Como mencionado acima, o que nos levou a escolher o tema Educação para a Paz foi à preocupação com o Ser Humano em nossa sociedade, para sermos mais específicos sob o prisma da moralidade e da generosidade. Todos os dias nos deparamos com inúmeras disputas na sociedade, com grupos sociais que se dizem civilizados, em acirradas lutas pessoais por ascensão social, dinheiro, poder, etc. Muitas vezes esquecendo a moralidade e o respeito. Grande parte destes valores está se perdendo ao longo da história da humanidade, a escola também deve desenvolver os princípios morais que tiveram início no seio familiar, estabelecendo uma ligação com a generosidade por esta ser essencial no processo de educação das crianças. Ser generoso é ter sentimentos nobres, querer ajudar o próximo e fazê-lo sem visar reconhecimento ou gratificações. 
Neste sentido reforça-se a importância de desenvolver trabalhos voltados para uma educação de cultura da Paz na escola e na sociedade.



A amplitude do tema educação para a paz faz com que educadores busquem diariamente trabalhar valores que promovam a paz dentro e fora da escola. Portanto é necessário ampliar o olhar para a convivência diária, não como se para tratar da paz precisasse existir a violência. A prevenção de conflitos é a capacidade de promover um conjunto de atividades destinadas a estabelecer a construção da paz. No entanto existem complexidades inerentes da falta de projetos específicos voltados para o tema, limitando a ação dos educadores. Isso pode resultar na não abrangência total do tema e restringir os educadores a trabalhar paralelamente aos conteúdos da grade curricular.
Ao longo do trabalho de pesquisa realizado na escola parceira se percebeu a falta de um projeto especifico voltado para o tema educação para a paz, mesmo assim são desenvolvidas atividades dinâmicas que trabalham o tema. Naturalmente os desafios surgem e as reivindicações também, isto quer dizer que a escola deve estar preparada para esta pedagogia crítica voltada para os valores humanos.


Referências
André Comte-Sponville, Pequeno tratado das grandes virtudes; tradução Eduardo Brandão. - São Paulo, Editora WMF Martins Fontes, 1995.
Celso Antunes, Relações Interpessoais e autoestima: A sala de aula como um espaço de crescimento integral, Petrópolis, Editora Vozes, 2009.
Lia Diskin, Laura Gorresio Roizman, Paz Como se faz?: semeando cultura de paz nas escolas – Rio de Janeiro: Governo do Estado do Rio de Janeiro, UNESCO, Associação Palas Athena, 2002.
Prof. Maurício Apolinário, A Responsabilidade Moral Do Professor http://www.evirt.com.br/desafio/cap14.htm - acessado em 05/10/2009
Ubiratan D’Ambrosio, Educação para a paz – 2000 - http://www.sociologia.org.br/tex/educacaoparaapaz.htm – acessado em 01/10/2009
www.comitepaz.org.br– acessado em 07/10/2009
www.unipaz.org.br– acessado em 07/10/2009
www.educapaz.org.br– acessado em 07/10/2009
www.soudapaz.org.br– acessado em 07/10/2009
www.redepaz.org– acessado em 07/10/2009
http://comatematica.blogspot.com/2007/05/ubiratan-dambrsio-entrevista-paulo.html– acessado em 03/10/2009


Autoras:       Catia Cilene Azeredo dos Santos Alves* e
            Elida Nadir dos Santos Coelho**
 * **Alunas do Curso de Licenciatura em Pedagogia a Distância/UFPel.


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